sexta-feira, 29 de junho de 2012

Por que Abilio Diniz é um dos (raros) empresários pops do Brasil

Nos Estados Unidos, o culto aos empresários é tão forte quanto ao de celebridades do mundo dos esportes e das artes. Afinal, Warren Buffett, Bill Gates, Steve Jobs e companhia personificam a cultura empreendedora tipicamente americana. No Brasil, são raros os empresários que alcançam uma fama parecida. Abilio Diniz é um dos poucos privilegiados.

Suas tacadas de sucesso transformaram o Pão de Açúcar em um gigante de varejo brasileiro. Outras não escaparam de um certo enrosco. A tentativa de união com o Carrefour, a complicada negociação com a rede carioca Sendas, as desavenças com a família Klein após a fusão com as Casas Bahia e, mais recentemente, o pedido de arbitragem pela compra do Ponto Frio são algumas das operações que fazem parte dessa lista.

Hoje, o empresário está prestes a perder o controle do grupo fundado por seu pai para o francês Casino. Embora com menos poder - e com alguns episódios controversos no currículo -, Abilio ainda deverá conservar, por algum tempo, sua popularidade entre a gente comum, que o vê como um trabalhador incansável, amante dos esportes, alguém preocupado com valores e com a qualidade de vida dentro da sua companhia. Veja os pontos que explicam por que Abilio tornou-se um legítimo representante do lado mais pop do capitalismo brasileiro (e o que isso revela sobre como os empresários são vistos por aqui):

Herdeiro que faz

Histórias de quem venceu na vida têm sua dose de apelo. E a trajetória do Pão de Açúcar é carregada dessas reviravoltas. A rede nasceu como uma doceria em São Paulo, criada pelo imigrante português Valentim dos Santos Diniz em 1948. Depois de inaugurar duas filiais, Seu Santos, como era conhecido, resolveu apostar no modelo de auto-atendimento que fazia sucesso nos Estados Unidos, abrindo seu primeiro supermercado no fim dos anos 50.

O negócio deu certo. A tormenta chegaria duas décadas depois. O primeiro imbróglio foi familiar. O fundador distribuiu ações a seus filhos em 88. O primogênito Abilio ficou com a maior fatia, e seus irmãos, insatisfeitos, resolveram brigar por um novo rearranjo. A contenda só terminou no fim de 93. Abilio assumiu a presidência e tornou-se dono de 51% das ações do Grupo Pão de Açúcar (GPA). Quatro dos outros cinco filhos venderam suas participações nesse meio tempo. Com dois deles, Abilio passou anos sem conversar. 

Para manter-se de pé, o Pão de Açúcar também teve que passar por uma penosa reestruturação: acossada por uma crise de liquidez, a rede de supermercados beirou a falência. Com o intuito de reverter a situação, o GPA fechou quase metade de suas lojas e demitiu milhares de funcionários. Depois de perder a liderança do mercado para o Carrefour, em 1991, passou a investir na melhoria da rentabilidade e a buscar um sócio para crescer.

Em 1999, vendeu uma participação ao francês Casino. Seis anos depois, recebeu um novo aporte de capital dos franceses, com a contrapartida de entregar o controle da rede em junho deste ano. A injeção de dinheiro surtiu efeito. Em 2011, o GPA fechou o ano com receita líquida de 46,6 bilhões de reais. Há uma década, esse número era de 8 bilhões.

Entre altos e baixos, Abilio solapou a imagem de um herdeiro que não hesita em por a mão na massa. É o que acredita Júlio Moreira, professor de branding da ESPM. "O Abilio pegou o que o pai fez e transformou em uma coisa maior, dando uma cara para essa empresa", diz. "As pessoas enxergam um exemplo de vitória e determinação."

O empresário do bem

Com uma experiência de década à frente do Pão de Açúcar, o executivo entrou em contato com a Fundação Getúlio Vargas, onde estudou, com o intuito de compartilhar aprendizados de gestão. "Em escolas brasileiras, grande parte dos casos estudados vêm de fora, principalmente dos Estados Unidos. E nem sempre estão bem alinhados à realidade local", afirma o professor da instituição Jaci Correa Leite.

A FGV topou a empreitada: desde 2010 turmas têm ensinamentos sobre liderança com base na trajetória do executivo. São quinze sessões semanais ao custo de 3.668 reais. Abilio costuma aparecer em até quatro delas. Coordenador do curso, Leite acredita que o fato de Abilio ser visto como uma referência se dá mais “por que” do que “apesar de” seus eventuais tropeços. A razão? Seu comprometimento com o negócio, mas também com as pessoas, com espiritualidade e responsabilidade social.

"Os que estão ao lado dele reconhecem e aceitam sua liderança porque acima de tudo confiam nele como pessoa", afirma. "Abilio Diniz encarna aquele adágio do 'walk the talk', ou seja, aja de acordo com o que você diz", completa o professor.

Para transmitir esses valores, Abilio bebe da mesma fonte de gurus internacionais. Seus prediletos, sempre lembrados pelo executivo nas redes sociais, já vieram ao Brasil dar treinamento a gerentes e diretores do Pão de Açúcar. Ex-professor de Stanford, Jim Collins sustenta que a humildade é inerente ao bom líder, que se preocupa antes com o sucesso da empresa do que com sua própria riqueza ou fama. O indiano Raj Sisodia vai na mesma linha: executivos devem investir em um propósito firme para suas empresas – valores que deixariam as pessoas comuns sentirem saudades caso as companhias deixassem de existir. 

Paz, amor e... saúde. Para Abilio, a prática de esportes é outro pilar importante para manter o foco. Aos 75 anos, o executivo faz ginástica religiosamente e dedica até três horas por dia aos treinamentos - o primeiro deles começa às 5h30 da manhã. Em entrevistas, ele já afirmou que envelhecer em bom estado tornou-se uma obsessão depois do nascimento dos filhos pequenos. O caçula ainda não chegou aos cinco anos de idade.

A preocupação também faz parte da cultura corporativa do GPA. Estampada no auditório do Grupo, uma das frases prediletas de Abilio prega que é preciso buscar internamente qualidade de vida para ter a capacidade de servir qualidade de vida. Não por menos, os funcionários contam com uma academia, um grupo de corrida e quatro quadras de squash nas dependências da empresa. No encalço de Abilio - e na companhia do chefão -, vários participam de uma maratona anual em Nova York.

Até a marca própria do Pão de Açúcar, a Taeq, carimba produtos com o conceito de "vida em equilíbrio". Na opinião de Júlio Moreira, da ESPM, Abilio teria sido pioneiro em associar o nome da empresa à busca por vitalidade. E sua disposição em seguir em frente enquanto outros de mesma idade penduram as chuteiras não deixa de contar a seu favor. "O homem está chegando aos 80 com preparo físico que muitos jovens não têm. As pessoas gostam de ver um executivo de sucesso com filhos pequenos e ainda pensando em construir", afirma.

Comunicador virtual

Torcedor do São Paulo, devoto de Santa Rita de Cássia, esportista inveterado. Se você não conhece Abilio, basta entrar no seu perfil no Twitter e se juntar aos outros 158.000 seguidores para se familiarizar com essas e outras preferências. Nas redes sociais, o executivo dá palpites sobre a atuação do time, saúda os novos empregados do Pão de Açúcar e publica dicas de gestão.

Autor do livro "Caminhos e Escolhas", no qual divide sua receita para "uma vida mais feliz", Abilio também mantém um blog, onde não se esquiva de opinar sobre episódios controversos, como a tentativa de fundir o GPA às operações brasileiras do Carrefour, projeto que naufragou no ano passado e recebeu uma saraivada de críticas.

Moreira, da ESPM, acredita que Abilio entendeu como poucos a importância das redes para aproximar os consumidores da empresa. "Ele enxerga esses canais com uma naturalidade que outros executivos não veem", resume. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário